Questões
Acerca de Kamma
Por
Bhikkhu
Bodhi
Tradução
Davi
Coêlho
(1) Sobre Kamma
(2) Toda Escolha Nossa
Tem Um Tremendo Potencial para o Futuro
(3) Kamma é Como uma
Semente
(4) Tipos de Kamma
Baseado no Momento da Fruição
(5) Tipos de Kamma
Baseado em Razões Éticas – Kamma Hábil e Inábil
(6) Porque um é
Inteligente e o outro Néscio? Como Alguém Nasce Feio e Outro Belo
(7) Exame da Cosmologia
Budista
(8) A Mente é o Arquiteto
de Todo Universo
(9) Não Somos
Prisioneiros do Nosso Passado
(10) Indo Além de Kamma – O Objetivo Final do Caminho
SOBRE KAMMA
Há uma
variedade tremenda de seres vivos existentes no mundo. Pessoas e animais são os
dos mais diferentes tipos. O que é que nos causa a renascer em uma forma
particular? Isso acontece através da coincidência, por acidente, por chance sem
motivo algum ou há um princípio por trás disso? O que determina a forma do
renascimento que assumimos?
O Buda responde a
estas perguntas com o termo Pali “kamma”. Kamma é o fator que determina a forma
específica de renascimento, que tipo de pessoa somos desde o início de nossa
vida, e é kamma novamente que determina uma boa parte das experiências pelas
quais passamos durante o curso de nossas vidas.
A palavra “kamma”
significa literalmente ação, feitio ou fazer. Mas no Budismo ela significa
especificamente atividade volitiva.
O Buda diz:
“Monges, é a volição
que eu chamo de kamma. Pois por ter desejado, se age de acordo pelo corpo,
linguagem e mente”. O que realmente está por trás de todas as ações, a essência
de toda ação, é a volição, o poder da vontade. É esta volição expressando a si
mesma como ação corporal, da fala e mental que o Buda chama de kamma.
Isso significa que
ações não intencionais não são kamma. Se acidentalmente pisamos em algumas
formigas enquanto andamos pela rua, isso não é o kamma de tirar a vida, pois
não havia a intenção de matá-las. Se relatarmos algo pensando que é verdadeiro
e no final das contas não é, isso não é o kamma de mentir, pois não há a
intenção de enganar.
Kamma manifesta-se em
três modos, através de três “portas” de ação. Estas são o corpo, a fala e a
mente. Quando agimos fisicamente o corpo serve como o instrumento para a
volição. Isto é kamma corporal. Quando falamos, expressando nossos pensamentos
e intenções, isso é kamma verbal, que pode ser expresso diretamente através da
fala ou então indiretamente através da escrita ou outros meios de comunicação.
Quando pensamos, planejamos, desejamos intimamente, sem nenhuma ação exterior,
isso é kamma mental. O que está por trás de todas estas formas de ação é a
mente e o principal fator mental que causa a ação é a volição.
TODA ESCOLHA NOSSA TEM UM
TREMENDO POTENCIAL PARA O FUTURO
De
acordo com o Buda, nossas ações intencionais produzem efeitos. Elas
eventualmente retornam a nós mesmos. Um efeito imediatamente visível é o
psicológico. O outro efeito é a retribuição moral.
Primeiramente,
vamos considerar o efeito psicológico de kamma. Quando uma ação impulsionada
pela vontade é feita, isto deixa um rastro na mente, uma impressão que pode
marcar o início de uma nova tendência mental. Isso tem a tendência de repetir a
si mesmo, de se reproduzir, mais ou menos como um protozoário, uma ameba.
Conforme as ações se multiplicam, elas formam o nosso caráter. Nossa
personalidade é nada mais do que a soma de nossas ações feitas impulsionadas
pela vontade, uma seção transversal de todo nosso kamma acumulado. Portanto, ao
cedermos primeiramente em modos simples aos impulsos nocivos de nossas mentes,
construímos pouco a pouco um caráter ganancioso, um caráter hostil, um caráter
agressivo ou um caráter iludido. Por outro lado, ao resistirmos os impulsos
nocivos, os trocamos pelos seus opostos – as qualidades benéficas. Então
desenvolvemos um caráter generoso, uma personalidade amável e compassiva, ou
podemos nos tornar sábios e seres iluminados. Conforme mudamos nossos hábitos
gradualmente, mudamos o nosso caráter, e conforme mudamos nosso caráter,
mudamos nosso ser por completo, nosso mundo inteiro. É por isso que o Buda
enfatiza tão fortemente a necessidade de estarmos atentos a todas nossas ações,
a cada escolha. Pois cada escolha nossa tem um potencial tremendo para o
futuro.
Agora
examinemos os efeitos da retribuição moral. O que é mais importante a respeito
de Kamma é sua tendência de amadurecer no futuro e produzir resultados de
acordo com a lei moral universal.
Sempre
que fazemos uma ação com intenção, tal ação deposita uma “semente” na mente, e
uma semente tem o potencial de trazer efeitos no futuro. Estes efeitos
correspondem à natureza de nossa ação original. Eles se derivam do tom ético
inerente da ação. Nosso kamma nocivo volta a nós e conduz-nos ao nosso dano e
sofrimento. Nosso kamma benéfico
eventualmente retorna a nós e conduz-nos a nossa felicidade e bem-estar.
Visto
deste ângulo, do ponto de vista da lei kámmica, o universo aparenta manter
certo equilíbrio moral, um balanço entre todas as ações morais relevantes e as
situações objetivas daquelas que as fizeram. Portanto a lei do kamma é uma
aplicação moral do princípio geral de que para cada ação há uma reação igual e
oposta. Contudo, o funcionamento de kamma não é mecânico. Kamma é ação
intencionada e kamma é algo vivo e orgânico. Portanto, kamma permite muito
espaço para variação, para o jogo de forças vivas.
KAMMA É COMO UMA SEMENTE
Primeiramente,
nem todo kamma amadurece necessariamente. Apesar de ter a tendência a
amadurecer, ele não amadurece inevitavelmente. Kamma é como uma semente. As
sementes amadurecem apenas se elas encontrarem as condições corretas. Mas se
elas não encontram as condições corretas elas permanecem sementes; se elas
forem destruídas jamais poderão amadurecer. Similarmente, pode ser dito que
kamma procura por uma oportunidade de se manifestar. Ele tem uma tendência de
amadurecer. Se kamma encontra a oportunidade certa, então ele trará seus
resultados. Se não se deparar com as condições certas, não amadurecerá. Um
kamma pode até mesmo ser destruído por outro kamma. Portanto é importante entender
que nosso modo de vida atual, nossas atitudes e conduta, podem influenciar o
modo como nosso kamma passado se manifesta. Alguns kammas passados são tão
poderosos que eles têm que vim à fruição. Não podemos escapá-los não importa o
que façamos. Mas a maior parte de nossos kammas passados são condicionados pelo
modo como vivemos agora. Se vivemos de uma forma descuidada e imprudente,
daremos a oportunidade para nosso antigo kamma negativo amadurecer e fruir e
isso irá ou impedir que nosso kamma benéfico produza seu efeito ou que isso
cancele seus bons efeitos.
Por
outro lado, se vivemos prudentemente agora, daremos a chance a nossos bons
kammas de amadurecerem e bloquear nosso kamma nocivo ou enfraquecer seus efeitos,
destruí-los ou prevenir que eles venham a fruição.
TIPOS DE KAMMA BASEADO NO MOMENTO
DA FRUIÇÃO
Kamma
pode produzir resultados em momentos diferentes, até mesmo em vidas diferentes.
O Buda diz que há três tipos de kammas distinguidos pelo modo do momento em que
amadurecem. Há kammas que amadurecem nesta mesma vida, kammas que amadurecem na
próxima vida e kammas que amadurecem em uma vida depois da seguinte (vida). O
último tipo de kamma é o mais forte. Os primeiros dois tipos tornam-se defuntos
se eles não encontrarem uma abertura. Eles nunca irão amadurecer se não
encontrarem uma oportunidade para fruir nesta vida presente ou na próxima vida.
Mas o terceiro tipo permanece conosco enquanto continuarmos em Samsara. Ele
pode trazer seus efeitos até mesmo centenas e milhares de éons no futuro. Este
intervalo de tempo ajuda-nos a entender o que parece ser uma discrepância nos
funcionamentos de kamma.
Frequentemente
vemos boas pessoas que se deparam com tanto sofrimento e más pessoas que se
deparam com grande sucesso e boa sorte. Isso se dá por causa do intervalo de
tempo. O bom homem está colhendo os resultados de más ações do passado. Mas ele
eventualmente se deparará com os bons resultados do kamma positivo que ele está
fazendo no presente. Do mesmo modo, um homem mal está desfrutando os resultados
de suas boas ações do passado. Mas no futuro ele terá que se encontrar com a
fruição de seu kamma negativo e passar por sofrimento.
TIPOS DE KAMMA BASEADO EM RAZÕES
ÉTICAS – KAMMA HÁBIL E INÁBIL
O Buda
divide kamma eticamente bem no meio entre duas classes diferentes, kamma hábil
(kusala kamma) e kamma inábil (akusala kamma). Kamma inábil é
ação que é espiritualmente nociva e moralmente condenável. Kamma hábil é ação
que é espiritualmente benéfica e moralmente louvável.
Intenção
Há dois critérios básicos para
distinguir kamma hábil do inábil. Um deles é a intenção por trás da ação. Se
uma ação é intencionada a trazer dano a si mesmo, a outros, ou tanto a outros
como a si mesmo, então isso é considerado inábil. Kamma que conduz ao bem de si
mesmo, ao bem dos outros, ou ao bem de ambos é considerado hábil.
Raízes
O outro critério são as raízes da
ação. Toda ação surge de certos fatores mentais chamados de raízes. Estes são
os fatores causais por trás da ação ou fonte da ação. Todas as ações
inábeis surgem de três raízes nocivas – ganância, aversão e ilusão.
Ganância é desejo egoísta intencionado a gratificação pessoal, expresso como
apego, o desejo, e agarramento. Aversão é má-vontade, ódio, resentimento, raiva
e uma avaliação negativa do objeto. Ilusão é ignorância, falta de clareza
mental e confusão.
Também encontramos as raízes para
as ações
hábeis: não ganância, não aversão, e não ilusão. Não ganância torna-se
manifesta como o desapego e generosidade. Não aversão é expressa positivamente
como boa vontade, afabilidade e compaixão. Não ilusão é manifesto como
sabedoria, compreensão e clareza mental.
Devido a estas raízes devemos ter
muito cuidado quando julgamos nossas ações ou a de outros. Muitas vezes pode
haver uma gritante diferença entre a ação externa e o estado mental da qual
esta ação surgiu. Podemos observar muitos trabalhos bons de outros exteriormente,
mas os motivos por trás deles podem ser o desejo por fama ou reconhecimento,
uma forma de raiz nociva vindo da ganância e desejo. Outra pessoa pode estar
silenciosamente meditando, aparentemente indiferente, mas interiormente ele
pode estar desenvolvendo uma mente de compaixão e afabilidade. Ele pode ser
criticado por estar apenas procurando seu próprio bem, mas na verdade essa
pessoa pode estar trazendo mais benefício para o mundo do que o outro caso da
pessoa que está ativamente fazendo boas ações impulsionada por um desejo de
reconhecimento e fama.
A forma como kamma funciona é tão
complexa e sutil que é quase impossível fazer predições definitivas. Tudo que
conseguimos saber com certeza são as tendências, mas isso não é suficiente para
guiar nossas ações.
Ações Inábeis
Há dez tipos principais de ações
inábeis:
Corporal
1. Tirar a vida.
2.
Pegar para si o que não lhe pertence.
3.
Engajar em atividade sexual imprópria (adultério, sedução, etc.)
Verbal
4. Mentir.
5. Caluniar.
6.
Engajar em fofoca, conversa inútil.
7. Linguagem grosseira (xingamento, palavrões).
Mental
8.
Cobiça, desejar aquilo que pertence a outros.
9.
Má vontade (ativamente desejando que dano, sofrimento e destruição caiam
sobre os outros).
10.
Opiniões e pontos de vistas equivocados (especialmente pontos de vista
equivocados que negam a eficácia de ações morais).
Ao abstermos das ações acima,
desenvolvemos as virtudes opostas, ou seja, os dez cursos de ações hábeis.
PORQUE UM É INTELIGENTE E O OUTRO
NÉSCIO? COMO ALGUÉM NASCE FEIO E OUTRO BELO?
Kamma
produz seus resultados em meios diferentes. Há duas maneiras gerais pelo qual
ele vem à fruição:
1.
Produzindo o tipo de renascimento, a consciência
básica de renascimento.
2.
Produzindo vários resultados durante o curso de uma
existência.
No
momento da morte, um kamma particularmente dominante pode surgir à superfície
da mente e impulsionar o fluxo de consciência a uma nova existência. Uma vez
que o renascimento acontecer, certos outros kammas amadurecem durante o curso
da vida trazendo resultados favoráveis ou desfavoráveis.
Os bons
e maus resultados que surgem do kamma não são recompensas ou punições. Eles não
são impostos por qualquer poder externo. Ações produzem seus resultados
naturalmente através da lei de causa e efeito funcionando no mundo moral. Esta
lei natural é chamada de “kamma niyama”, a ordem de kamma, que funciona
autonomamente O Buda explica como kamma é a causa para diferenças entre o grau
de bem-aventurança das pessoas.
(a)
Algumas pessoas morrem prematuramente por que em vidas
passadas elas destruíram a vida.
(b)
Algumas são enfermas porque elas feriram ou
machucaram outros seres.
(c)
Aqueles que eram frequentemente raivosos ou duros
tornaram-se feios, aqueles que eram pacientes e alegres tornaram-se belos.
(d)
Alguns são ricos por causa de sua generosidade no
passado, alguns são pobres porque foram egoístas.
(e)
Alguns são influenciais porque se alegraram na
felicidade dos outros.
(f)
Alguns são fracos e impotentes porque foram
invejosos da felicidade dos outros.
(g)
Alguns são inteligentes porque foram refletivos e
estudiosos no passado, porque sempre inquiriram e investigavam a fundo as
coisas. Alguns são lentos e estúpidos porque foram preguiçosos e negligentes,
porque eles nunca estudaram ou exerceram o seu pensar.
Exame da Cosmologia Budista
O próximo
tópico a ser discutido é o plano de existência onde kamma produz renascimento.
Isso requer um pequeno exame da Cosmologia Budista, a imagem Budista do
universo.
O
Budismo divide o todo da existência senciente em três domínios básicos:
1.
O domínio da esfera sensual
2.
O domínio da materialidade sutil
3.
Os domínios da imaterialidade ou não forma
1 – Domínio da Esfera Sensual
Este é
o domínio mais baixo. Há seis planos de existência sob esta categoria:
(a)
Os infernos, estados de intenso tormento e sofrimento.
(b)
A esfera das ‘pretas’, os espíritos aflitos (ora
chamados de sombras famintas). Estes são seres com fortes e atormentados
desejos, fome e sede insaciáveis; eles estão sempre à procura de alimento e
bebida.
(c)
O reino animal. A característica dominante dos animais é o
embotamento mental e forte desejo brutal.
(d)
Esfera dos asuras. Seres Titânicos dominados pelo desejo pelo
poder, ambição e competitividade.
Os
infernos, esfera das pretas, asuras e o reino animal são chamados de ‘planos de
miséria’. Estes são estados de renascimento infelizes e indesejáveis. Na esfera
sensual há dois tipos de renascimentos favoráveis:
(e)
O mundo humano.
(f)
O mundo das devas (mundo celestial).
Devas são
seres habitando os mundos celestiais, desfrutando de longa vida, beleza,
felicidade e poder. Mas a vida nos céus também é impermanente, sujeita a
acabar, e portanto, o céu não é o objetivo final para aqueles que estão
seguindo o caminho do Buda para a libertação.
O Buda
aponta que de todos os planos de existência, o mais favorável para alguém que
está procurando a libertação é o mundo humano, pois ele tem um bom
equilíbrio entre os fatores opostos da vida. Por um lado, a vida humana não é
sobrecarregada com sofrimento. Ela permite lazer, descanso e conforto para
refletirmos sobre a natureza da existência para que possamos desenvolver nossa
compreensão. Por outro lado, o mundo humano não é tão intensamente prazeroso e
desfrutável que acabamos por nos enganar pelos prazeres e diversão. A duração
de vida não é tão longa que nos engana em acreditar que iremos viver para
sempre. É curta o suficiente para nos tornarmos cientes a respeito da verdade
da impermanência.
2 – Domínio da Materialidade
Sutil
Este é
o plano da matéria sutil. Estes estados de existência são muito mais puros do
que até mesmo os mundos celestiais da esfera sensual. Ali a mente se torna
brilhante e luminosa. A duração de vida é incrivelmente longa, durando por
muitos éons. E as manifestações mais grosseiras da matéria estão ausentes.
Estes mundos, contudo, também são impermanentes. A vida ali eventualmente chega
a um fim e o ser renascerá em outro lugar de acordo com seu kamma.
3 – Domínio Imaterial
Estes
estados de existência são inteiramente mentais. A mente retrocede sem qualquer
base material, absorvida em pura paz, equanimidade, por milhares de éons.
Nestas esferas também a vida finalmente chega a um fim e o fluxo de consciência
renasce em outro lugar conforme determinado por seu kamma.
Agora a
pergunta pode ser levantada sobre se uma pessoa com uma educação em ciência
pode realmente crer em uma cosmologia como esta, que parece ser antiga,
desatualizada e supersticiosa. Portanto devo dar aqui uma opinião pessoal. Para
mim a forma geral desta cosmologia parece defensável. Se conseguirmos ver a
lógica por trás da lei de kamma, e então considerarmos os diferentes tipos de
ação que as pessoas são capazes de fazerem, torna-se claro que deve haver
também diferentes planos de existência apropriados para a maturação de
diferentes tipos de kamma.
No caso
de cama tão ruim quanto a matança de milhares de pessoas cruelmente e sem
piedade, para tal kamma poder encontrar seus frutos a pessoa realizando tais
ações deve renascer em um plano de extremo sofrimento, os infernos. Por outro
lado, se alguém realizou ações muito nobres tais como doando um de seus
membros, sua vida ou sua fortuna para o bem de outros, se um indivíduo teve uma
mente afável e compassiva, também deve haver um correspondente plano de
existência para tal kamma produzir seus devidos efeitos. Estes são os domínios
celestiais. Além disso, quando entendemos os estados meditativos mais
avançados, os jhanas e os estados imateriais, e vemos como estes níveis mais
altos de consciência são tão incrivelmente diferentes do modo corriqueiro de
consciência, torna-se claro que eles também correspondem a outros planos de
existência. Assim a imagem inteira encaixa-se de forma bem harmoniosa.
A MENTE É O ARQUITETO DE TODO
UNIVERSO
O
motivo dominante para o renascimento é sempre encontrado em nossa própria
mente. Se olharmos em nossas mentes, veremos que há diferentes planos de
existência já contidos na mente na forma de semente.
As
forças dominantes em nossas mentes serão estados humanos, estados conectados ao
mundo humano. Este é o ‘tom’ básico de nossa consciência. Mas às vezes surgirá
estados de intensa raiva que pode encontrar sua expressão como violência ou
crueldade. Em tais momentos estamos construindo para nós mesmos um mundo
infernal. Psicologicamente podemos estar vivendo no inferno e kammicamente
estes estados são as sementes do renascimento para o inferno.
Em
outros momentos pensamentos muito nobres poderão surgir em nós, fazendo-nos
sentir divinos ou celestiais, pensamentos tais como generosidade suprema,
grande bondade e compaixão. Com tais pensamentos, nosso mundo torna-se mais
leve e puro, quase como um mundo celestial. Estes estados de mente são, de
fato, as sementes para o renascimento em um dos mundos celestiais.
Em
ocasiões de desejo cego, de brutalidade, de lascívia cega, ou topada estupidez,
podemos ver em nós mesmos o estado de mente animal. Estes estados são as
sementes para uma existência animal.
Podemos
às vezes ver o egoísmo, possessividade, e intenso apego. Em tais momentos a
mente torna-se similar aquela de uma preta, um espírito aflito, e estamos
plantando as sementes do renascimento no mundo das pretas.
Outras
vezes, surge estados de cobiça pelo poder, inveja e despeito, competitividade,
a ânsia pelo poder. Em tais momentos temos a mente de um asura e construímos a
base para o renascimento no mundo dos asuras.
Portanto
o que está por trás de todos estes planos de renascimento é a mente. Por isso o
Buda diz que a mente é o arquiteto do universo inteiro. Não devemos pensar
neste processo de renascimento em termos de um ser humano aparecendo em
diferentes planos, indo de mundo a mundo. Mas ao invés disto estes planos
simplesmente proveem um campo para a mente manifestar suas tendências
acumuladas. Estes planos são apenas manifestações visíveis, as projeções
externas das forças que estão ativas na mente.
NÃO SOMOS IMPOTENTES PRISIONEIROS
DE NOSSO PASSADO
Os
ensinamentos gêmeos de kamma e renascimento têm algumas implicações importantes
para a compreensão de nossas próprias vidas.
Primeiramente,
eles nos permitem compreender que somos inteiramente responsáveis por aquilo
que somos. Não podemos culpar nossos problemas no nosso ambiente, nossa
herança, no destino e nem no modo como fomos criados por nossos pais. Todos
estes fatores têm feito de nós o que somos, mas o motivo para nos depararmos
com essas circunstâncias é por causa de nosso kamma passado. Isso pode parecer
à primeira vista como uma doutrina pessimista. Parece implicar que somos
prisioneiros de nosso kamma passado, que temos que nos submeter aos seus
efeitos. Isso é uma distorção.
É
verdade que muitas vezes temos que colher os resultados de nossas ações
passadas. Mas o ponto importante a entender é que kamma é atividade volitiva, e
ação volitiva sempre acontece no presente, apenas no presente. Isso significa
que agora no presente é possível para nós mudarmos inteiramente a direção de
nossas vidas.
Se
examinarmos detalhadamente nossas vidas veremos que nossas experiências são de
dois tipos: primeiro, a experiência que vem a nós de forma passiva, que
recebemos independentemente de nossa escolha; e segundo, experiência que criamos
para nós mesmos através de nossas escolhas e atitudes. O lado passivo da
experiência é pela maior parte o efeito de kamma passado. Geralmente temos de
encarar isso e aprender a aceitar. Mas dentro dessas limitações há espaço, o
tremendo espaço do momento presente, no qual podemos reconstruir nosso mundo
com nossas próprias mentes.
Se nos
permitirmos sermos dominados por egoísmo, ódio, ambição e torpor, então, mesmo
que sejamos agora ricos e poderosos, ainda sim viveremos em miséria e
sofrimento e continuaremos a plantar as sementes do renascimento em um mundo de
sofrimento. Por outro lado, mesmo que sejamos pobres e em tristes
circunstâncias, com muita dor e azar, se tivermos uma conduta pura,
desenvolvemos uma mente de generosidade, bondade e compreensão, então podemos transformar
nosso mundo, podemos construir um mundo de paz e amor.
INDO ALÉM DE KAMMA – O OBJETIVO
FINAL DO CAMINHO
O
objetivo final do caminho do Buda não é simplesmente atingir bons resultados
pela realização de kamma benéfico. Este é um objetivo mundano. O verdadeiro
alvo do caminho é ir inteiramente além das correntes de kamma e resultados.
Enquanto
continuarmos realizando e acumulando kamma, permanecemos sujeitos ao nascimento
e morte, e nos depararemos com sofrimento em suas diversas manifestações. Quer
estejamos vivendo em um mundo favorável ou um mundo de infortúnios, isso é
secundário. Todos os estados de existência são impermanentes, sem substância e
insatisfatórios.
Kamma é
gerado por causa do apego, apego por ações boas ou más. O apego está enraizado
na ignorância. Ao desenvolvermos atenção plena e insight, por aprender a ver as
coisas como elas realmente são, podemos por um fim ao apego e quebrarmos as
correntes de kamma. Então descobrimos a liberdade além de kamma, a liberdade da
libertação.
O arahant, aquele que foi liberto, não gera mais kamma algum. Ele
continua a agir e realizar ações volitivas, mas sem apego. Portanto suas ações
não constituem mais kamma. Elas não deixam quaisquer rastros sobre a mente.
Elas não tem a potência para amadurecer no futuro para trazer o renascimento.
As atividades dos arahants são chamadas “Kriyas” ou não kammas. São ações
simples. Não deixam quaisquer traços sobre o contínuo mental, assim com o voo
dos pássaros pelo céu.
O seguinte artigo pode ser encontrado em inglês no endereço: http://www.budsas.org/ebud/ebdha057.htm
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